domingo, 21 de março de 2010

Fogo Frio

Fogo Frio

Um fogo frio escorre lento como a ampulheta que marca o passo dos dias.
Risca o olhar com uma sombra de esperança, sopra a brisa da saudade sobre os campos do coração.
Um fogo frio que não queima a carne, recolhe os suores da alma e nos faz irmãos nesta caminhada.
Na calmaria das horas, os ventos não inflam as velas, fugiram para outras paragens, nos deixaram à deriva ante a linha do horizonte.
Um fogo frio, que acalenta o desejo, não nos deixa ensandecer, gozar o delírio febril dos que se perdem na noite, embriagados com o luar, entorpecidos de amor.
Na maciez dos sonhos, despede-se solene e embarca no comboio das lembranças, perdendo-se entre as letras, até que o cansaço nos vença o espírito.
Um fogo frio que serve de espelho, onde a imagem da dor é mais farta, onde as pedras reluzem as pontas e desenham fortalezas.
Numa fuga desesperada, o esquecimento fatal, que abraça meu corpo fatigado e faz meu coração lamentar.
Um fogo frio que fumega o peito, um acalanto fraterno de dois corpos que já não gritam, de dois olhos que perdem o brilho, duas vozes que já não cantam a cantilena dos ébrios, que beberam todas as gotas nas taças de um grande amor.
Na ironia das horas, o sorriso do tempo escarnece das vagas que se perderam no azul profundo do mar... gargalha do roto das velas, zomba dos sonhos diurnos, quando a noite que se anuncia, aconchega-se no fogo frio para ouvir meu soluçar.

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